domingo, 5 de maio de 2013

"Cantar de Vero Amor

                                          A Heitor Grillo

I

Assim aos poucos vai sendo levada
a tua Amiga, a tua Amada!
E assim de longe ouvirás a cantiga
da tua Amada, da tua Amiga.

Abrem-se os olhos – e é de sombra a estrada
para chegar-se à Amiga, à Amada!
fechem-se os olhos – e eis a estrada antiga
a que levaria à Amada, à Amiga.

(Se me encontrares novamente, nada
te faça esquecer a Amiga, a Amada!
Se te encontrar, pode ser que eu consiga
ser para sempre a Amada Amiga!)

II

E assim aos poucos vai sendo levada
a tua Amiga, a tua Amada!

E talvez apenas uma estrelinha siga
a tua Amada, a tua Amiga.
Para muito longe vai sendo levada,
desfigurada e transfigurada.

Sem que ela mesma já não consiga
dizer que era a tua profunda Amiga.

Sem que possa ouvir o que tua alma brade:
que era a tua Amiga e que era a tua Amada

Ah! do que disse nada mais se diga.
Vai-se a tua Amada – vai-se a tua Amiga!

Ah! do que era tanto, não resta mais nada...
Mas houve essa Amiga! Mas houve essa Amada!
"

*Cecília Meireles*

Em “Poesias Completas de Cecília Meireles, Viagem, Vaga Música”, Rio de Janeiro, 
Editora Civilização Brasileira - MEC, 1973.

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