domingo, 31 de dezembro de 2017

Que as sementes da fraternidade sejam semeadas no ANO NOVO!
Que o amor seja capaz de vencer toda a maldade.
Que as bênçãos de DEUS alcance todo o Brasil, 
levando-nos ao REENCONTRO
com a Alegria, com a Paz, com a União e a Solidariedade!
Feliz tempo novo!
E o melhor do infinito para todos nós!
Bendito quem inventou o belo truque do calendário,
pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo
é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça...
”  

*Desconheço a autoria*

Ano Bom

Hoje começa o ano. Na alegria
De nívea pomba quando nasce a aurora,
Deixa, minh’alma, a tua fantasia
Subir, cantando, pelo espaço a fora...

Deixa-a sumir-se além, rompendo gazas,
Subindo em busca de ideais queridos:
Há de trazer nas pequeninas asas
Todo o perfume dos meus dias idos!

Há de trazer o sonho transparente
Da inocência feliz (quanto eu sonhava!)
E o eco virginal da voz dolente
Que o meu sono de arcanjo acalentava.

E o meu sorriso e as minhas esperanças,
Essas ingênuas ilusões de um dia,
Toda essa luz que as almas das crianças
Num raio de luar acaricia...

Que tudo venha sobre mim cantando
O salmo doce da recordação.
Qual se pousesse um luminoso bando
De passarinhos no meu coração...


*Auta de Souza*
Em “HORTO”, Natal/RN, Fundação José Augusto, 4ª edição, 1970.
As portas do ano rasgam-se,
tal as da linguagem,
para o desconhecido.
Ontem à noite, disseste-me:
amanhã,
haverá que esboçar sinais,
desenhar paisagens, tecer a trama
sobre a dupla página
do papel e do dia.
Amanhã haverá que inventar,
de novo,
a realidade do mundo.

Já tarde, abri os olhos.
No instante de um instante,
senti, como o asteca
a espreitar
p'los penedos do promontório,
p'las gretas de horizonte,
o incerto regresso do tempo.


*Octavio Paz*
Em “ÁRVORE ADENTRO” (Trad. Luís Alves da Costa), Lisboa, 
Veja Editora, 1ª Edição, 1994, pág. 104.
Procuro uma alegria
uma mala vazia
do final de ano
e eis que tenho na mão
– flor do cotidiano –
é vôo de um pássaro
é uma canção.


Dezembro de 1968

*Carlos Drummond de Andrade*
Fragmento de uma das cartas enviadas a Lázaro Barreto, amigo epistolar de Drummond.

sábado, 30 de dezembro de 2017

Este espaço completa, hoje, 
30 de dezembro de 2017, 
o seu 5º aniversário de ajuntamentos líricos!...
Velut Umbra

Fumo e cismo. Os castelos do horizonte
Erguem-se, à tarde, e crescem, de mil cores,
E ora espalham no céu vivos ardores,
Ora fumam, vulcões de estranho monte...

Depois, que formas vagas vêm defronte,
Que parecem sonhar loucos amores?
Almas que vão, por entre luz e horrores,
Passando a barca desse aéreo Aqueronte

Apago o meu charuto quando apagas
Teu facho, oh sol... ficamos todos sós...
É nesta solidão que me consumo!

Oh nuvens do Ocidente, oh cousas vagas,
Bem vos entendo a cor, pois, como a vós,
Beleza e altura se me vão em fumo!

         
*Antero de Quental*
Em “Sonetos (antologia), org. José Lino Grunewald”, Rio de Janeiro,
Editora Nova Fronteira, 1ª Edição, 1991.

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Orgulho

                                           A Sócrates Dinis

Quando todos começarmos do chão como as sementes,
como as árvores fortes, como as árvores úteis,
e não houver parasitas dos ramos alheios;

quando a terra pertencer aos homens, como aos rios
que a fecundam sem ver cercados nem fronteiras;

e tudo o que existir, e o que for encontrado,
a água pura, o petróleo, o ouro, o fruto agreste,
não tiver donos também, como as auroras e os crepúsculos,
como as estrelas e a noite, como as nuvens e o sol;

quando houver sempre um teto sobre todas as cabeças
resguardando-as das chuvas, protegendo-as dos ventos,
como há sempre sobre nós o côncavo dos céus;

quando todos tiverem jardins, flores e pássaros,
ou crianças barulhentas, sadias e tagarelas,
e tiverem a horas certas, na mesa branca, o pão,
e a horas incertas no leito, o remédio necessário;

quando o trabalho for leve, alegre como a música
nas horas de prazer e despreocupação,
e em verdade, for a alegria e a música da vida;

quando a boca que se abre pela primeira vez
tiver um seio farto e o cuidado da ciência;

e a infância, liberdade, brinquedos e recreios,
e a juventude, livros, planos e companheiras,
e os homens todos, os mesmos meios de conquista,
e já não existir medo do mundo nem da vida
porque a vida e o mundo estarão ao nosso alcance;

quando a velhice não tiver mais receio do tempo
porque o tempo a levará em segurança ao fim;

quando já não houver trabalhos dignos e indignos
porque todas as parcelas estarão na mesma soma,
e o sábio e o operário, o artista e o camponês,
seguirem, paralelamente, os seus caminhos,
sem nunca se encontrar, mas sem humilhações;

quando as gramáticas e as raças não separarem os homens
porque todos se entenderão sem raças nem gramáticas,
e verão que mais além das cores e dos idiomas
está o Homem –  e só por isso, somos iguais e irmãos;

quando nossos filhos crescerem sem a angústia do futuro
e nós vivermos em paz sem as incertezas do presente,
e já não restar vestígios do ódio perdido no passado;

quando todos os templos erguerem sobre a terra
suas torres, minaretes, cruzes ou abóbadas,
e sobre eles, mais alto, o céu se desdobrar
para que todos os olhos se encontrem e se compreendam;

quando todos começarmos do chão como as sementes
embora os galhos se elevem às mais várias alturas
e façam sobre o solo as sombras mais diversas;

e todos forem donos de seus próprios pés
e todos forem donos de suas próprias mãos,
e do seu pensamento, e do seu coração;

quando, enfim, nos tornarmos Senhores de nós mesmos,
e não houver falsas leis servindo aos poderosos
e a justiça socorrer, na rua, aos homens todos;

quando chegar o momento em que a força será inútil,
porque todos seremos fortes e nada nos vencerá,
e não houver grades nos olhos, e não houver ferros nos pulsos,
nem morais absurdas que nos deformem e domem:

– então, sim, bendirei o instante em que nasci
e sentirei o orgulho de ser homem!


*J. G. de Araújo Jorge*

 Em “ANTOLOGIA POÉTICA – Volume I”, Rio de Janeiro, Editora Novo Tempo Edições, 2ª Edição, 1982.
Ó sino da minha aldeia

Ó sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro de minha alma.

E é tão lento o teu soar,
Tão como triste da vida,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida.

Por mais que me tanjas perto
Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho.
Soas-me na alma distante.

A cada pancada tua,
Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto.
”             

*Fernando Pessoa*
Em “Poesias de FERNANDO PESSOA”, Lisboa, Editora Ática, 15ª Edição, 1995.
Abrigo Celeste

Estrela triste a refletir na lama,
Raio de luz a cintilar na poeira,
Tens a graça sutil e feiticeira,
A doçura das curvas e da chama.

Do teu olhar um fluido se derrama
De tão suave, cândida maneira
Que és a sagrada pomba alvissareira
Que para o Amor toda a minh’alma chama.

Meu ser anseia por teu doce apoio,
Nos outros seres só encontra joio,
Mas só no teu todo o divino trigo.

Sou como um cego sem bordão de arrimo
Que do teu ser, tateando, me aproximo,
Como de um céu de carinhoso abrigo.

*Cruz e Sousa*
Em “Últimos Sonetos de Cruz e Sousa”, Forianópolis-Rio de Janeiro, 
Editora da UFSC/Co-edição Fundação Casa de Rui Barbosa, 3ª Edição Revista, 1997.
[...]
 
E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
vê-la desfiar seu fio,
que também se chama vida,
ver a fábrica que ela mesma,
teimosamente, se fabrica,
vê-la brotar como há pouco
em nova vida explodida;
mesmo quando é assim pequena
a explosão, como a ocorrida;
mesmo quando é uma explosão
como a de há pouco, franzina;
mesmo quando é a explosão
de uma vida severina.


*João Cabral de Melo Neto*
Em “MORTE E VIDA SEVERINA - AUTO DE NATAL PERNAMBUCANO”, 
Rio de Janeiro, Editora ALFAGUARA, 1ª Edição, 2016.
Romance de Cabiúna

Cabiúna era menino
E dizia: ‘Eu vou na Europa’.
A mãe dele respondia:
‘ – Fica quieto, Cabiúna.
Cabiúna, não me amola’.

A mãe dele não gostava.
Ralhava sempre, ralhava...
De dia ela costurava
Em frente ao mar, na janela.
E, costurando, cantava.

‘ – Minha mãe, eu cresço logo,
Fico grande e vou na Europa.
Deixa eu ir, minha mãezinha?’
‘ – Que menino sem cabeça!
Sai daqui, não me aborreça.’
‘ – Deixa eu ir, minha mãezinha...’

Mas toda noite ela entrava
No quarto em que ele dormia
E, junto dele, chorava.
Cabiúna ficou grande,
Ficou grande e foi-se embora.
Trabalhando de taifeiro
Num navio brasileiro.

Aconteceu que uma noite,
Junto de um cais estrangeiro,
Virou criança: chorava.
Alguém, passando, assobiava
Uma canção parecida
Com as que a mãe dele cantava.


*Ribeiro Couto*

Em “POESIA BRASILEIRA PARA A INFÂNCIA, CASSIANO NUNES E MÁRIO DA SILVA BRITO”, 
São Paulo, Editora Saraiva, 1968.
Branca de Neve

Eu te guardo no fundo da memória,
como guardo, num livro, aquela flor
que marca a tua delicada história,
Branca de Neve, meu primeiro amor.

Amei-te... E amei-te, figurinha aluada,
porque nunca exististe e porque sei
que o sonho é tudo – e tudo mais é nada...
E és o primeiro sonho que sonhei.

Hoje ainda beijo, comovido e tonto,
a velha mão que um dia me mostrou
aquela estampa do teu lindo conto,
princesinha encantada de Perrault!

Que fui eu afinal? – Um pobre louco
que andou, na vida, procurando em vão
sua Branca de Neve que era um pouco
do sonho e um pouco de recordação...

Procurei-a. Meus olhos esperaram
vê-la passar com flores e galões,
tal qual passaste quando te levaram,
no ataúde de vidro, os sete anões.

E encontrei a Saudade: ia alva e leve
na urna do passado que, afinal,
é como o teu caixão, Branca de Neve:
é um ataúde todo de cristal.

E parecia morta: mas vivia.
Corado do meu beijo que a roçou,
despertei-a do sono em que dormia,
como o Príncipe Azul te despertou.

Sinto-me agora mais criança ainda
do que naqueles tempos em que li
a tua história mentirosa e linda;
pois quase chego a acreditar em ti.

É que o meu caso (estranha extravagância!)
é a tua história sem tirar nem pôr...
E esta velhice é uma segunda infância,
Branca de Neve, meu primeiro amor.


*Guilherme de Almeida*
Em “Encantamento, Acaso, Você”, Campinas/SP, Editora UNICAMP, 1ª Edição, 2002.

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Cartão de Natal

Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de vôo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:

que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem,
o sim comer o não.


*João Cabral de Melo Neto*
Em “João Cabral de Melo Neto - Obra Completa”, Rio de Janeiro, Editora Nova Aguilar, 1994.
Poema de Natal

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos –
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.

Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos –
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.

Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai –
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.

Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte –
De repente nunca mais esperaremos…
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.


*Vinicius de Moraes*
Em “Poesia Completa e Prosa – Volume único”, Rio de Janeiro,
Editora Nova Aguilar S/A, 4ª Edição, 2004.

domingo, 24 de dezembro de 2017

Brinquedos
                   
São Nicolau de barbas brancas,
de alto capuz beneditino,
nas costas levava um grande saco
e vai seguindo o seu destino.

É muito tarde.  Nas janelas,
há sapatinhos ao sereno:
a cada espera corresponde
o sonho leve de um pequeno.

Súbito, estaca na calçada;
uma janela está vazia
e, pelas frinchas de uma porta,
chegam rumores de alegria.

O Santo pára; está amuado,
acha que o mundo é muito mau
e estas crianças já não querem
esperar por São Nicolau.

Mas, logo fica curioso,
quer descobrir porque naquela
casa não há um sapatinho
no canto escuro da janela.

Vai espiar pelo buraco
da fechadura…  – Pobrezinhos,
são os meninos do trapeiro,
nunca tiveram sapatinhos…

E vê, que à falta de bonecas,
eles divertem o casal,
enquanto o avô fuma num canto,
São Nicolau, mas de avental…

Todos estão muito contentes
o Santo ri de olhos molhados
e vai seguindo à luz branquinha
do plenilúnio nos telhados.

Pisa de leve sobre as folhas,
diz a sorrir palavras mansas:
‘Essas crianças são os brinquedos
e esses papais são as crianças…’
.”

*Afonso Schmidt*

Em “POESIA BRASILEIRA PARA A INFÂNCIA, CASSIANO NUNES E MÁRIO DA SILVA BRITO”, 
São Paulo, Editora Saraiva, 1968.

sábado, 23 de dezembro de 2017

Que este natal seja Santo e Feliz!
E que o Menino Jesus, esteja 
no olhar de cada um de nós!...
“Contra o muro

Pulou no rio a menina
cuja mãe não disse: minha filha.
Me consola, moço.
Fala uma frase, feita com meu nome,
para que ardam os crisântemos
e eu tenha um feliz natal!
Me ama. Os homens de nucas magras
furam os toucinhos com o dedo,
levantam as mantas de carne
e pedem um quilo de sebo.
Toca minha mão.
Quem fez o amor não vazará meus olhos
porque busco a alegria.
A vida não vale nada,
por isso gastei os meus bens,
fiz um grande banquete e este vestido.
Olha-me para que ardam os crisântemos
e morra a puta
que pariu minha tristeza.”

*Adélia Prado*
Em “O Coração Disparado”, Rio de Janeiro, Editora Record, 1ª Edição, 2006.
Neste dia alegre e doce,
de festas, sentimental,
queria que você fosse
meu presente de Natal.
”     

*J. G. de Araújo Jorge*
Em “Os mais belos poemas que o amor inspirou ”, São Paulo,
Editora Rideel Ltda., 4ª Edição, 1970.
Natal Divino
 
Natal divino ao rés-do-chão humano,
Sem um anjo a cantar a cada ouvido.
Encolhido
À lareira,
Ao que pergunto
Respondo
Com as achas que vou pondo
Na fogueira.

O mito apenas velado
Como um cadáver
Familiar…
E neve, neve, a caiar
De triste melancolia
Os caminhos onde um dia
Vi os Magos galopar…


*Miguel Torga*
Em
Poesia Completa, Lisboa, Publicações Dom Quixote, Volume II, 2ª Edição, 2002.
Rosas de Inverno

Corolas, que floristes
Ao sol do inverno, avaro,
Tão glácido e tão claro
Por estas manhãs tristes.

Gloriosa floração,
Surdida, por engano,
No agonizar do ano,
Tão fora da estação!

Sorrindo-vos amigas,
Nos ásperos caminhos,
Aos olhos dos velhinhos
Às almas das mendigas!

D’esse Natal de inválidos
Transmito-vos a bênção,
Com que vos recompensam
Os seus sorrisos pálidos.


*Camilo Pessanha*
Em “Clepsydra e outros poemas”, Lisboa, Editora Ática, 1ª Edição, 1969.
O Filho do Homem

O mundo parou
A estrela morreu
No fundo da treva
O infante nasceu.

Nasceu num estábulo
Pequeno e singelo
Com boi e charrua
Com foice e martelo.

Ao lado do infante
O homem e a mulher
Uma tal Maria
Um José qualquer.

A noite o fez negro
Fogo o avermelhou
A aurora nascente
Todo o amarelou.

O dia o fez branco
Branco como a luz
À falta de um nome
Chamou-se Jesus.

Jesus pequenino
Filho natural
Ergue-te, menino
É triste o Natal.


*Vinicius de Moraes*
Em “Poesia Completa e Prosa - volume único”, Rio de Janeiro,
Editora Nova Aguilar S/A, 4ª Edição, 2004.
Natal

No ermo agreste, da noite e do presepe, um hino
De esperança pressaga enchia o céu, com o vento...
As árvores: ‘Serás o sol e o orvalho!’ E o armento:
‘Terás a glória!’ E o luar: ‘Vencerás o destino!’

E o pão: ‘Darás o pão da terra e o pão divino!’
E a água: ‘Trarás alívio ao mártir e ao sedento!’
E a palha: ‘Dobrarás a cerviz do opulento!’
E o teto: ‘Elevarás do opróbrio o pequenino!’

E os reis: ‘Rei, no teu reino, entrarás entre Palmas!’
E os pastores: ‘Pastor, chamarás os eleitos!’
E a estrela: ‘Brilharás, como Deus, sobre as almas!’

Muda e humilde, porém, Maria, como escrava,
Tinha os olhos na terra em lágrimas desfeitos:
Sendo pobre, temia; e, sendo mãe, chorava.

*Olavo Bilac*
Em “Vida e poesia de OLAVO BILAC”, São Paulo, Editora Novo Século, 5ª Edição, 2007. 
Natal

Turvou-se de penumbra o dia cedo;
Nem o sol apertou no meu beiral!
Que longas horas de Jesus! Natal...
E o cepo a arder nas cinzas do brasedo...

E o lar da casa, os corações aos dobres,
É um painel a fogo em seu costume!
Que lindos versos bíblicos, ao lume,
P’lo doce Príncipe cristão dos pobres!

Fulvas figuras pra esculpir em barro:
À luz da lenha, em rubro tom bizarro,
Sou em Presépio com meus pais e irmãos

E junto às brasas, os meus olhos postos
Nesta evangélica expressão de rostos,
Ergo em graças a Deus as minhas mãos.


*Afonso Duarte*
Em “AFONSO DUARTE - OBRA POÉTICA - BIBLIOTECA DE AUTORES PORTUGUESES”,
Lisboa, IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, 2008.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Versos de Natal

Espelho, amigo verdadeiro,
Tu refletes as minhas rugas,
Os meus cabelos brancos,
Os meus olhos míopes e cansados.
Espelho, amigo verdadeiro,
Mestre do realismo exato e minucioso,
Obrigado, obrigado!

Mas se fosses mágico,
Penetrarias até ao fundo desse homem triste,
Descobririas o menino que sustenta esse homem,
O menino que não quer morrer,
Que não morrerá senão comigo,
O menino que todos os anos na véspera do Natal
Pensa ainda em pôr os seus chinelinhos atrás da porta.
”    

*Manuel Bandeira*
Em “Antologia Poética”, Rio de Janeiro, Editora José Olympio, 16ª Edição, 1986.
Quem me acode
à cabeça e ao coração
neste fim de ano,
entre alegria e dor?

Que sonho,
que mistério,
que oração?
Amor.
 
                       Dezembro de 1985.                      

*Carlos Drummond de Andrade*
Fragmento de uma das cartas enviadas a Lázaro Barreto, amigo epistolar de Drummond.
Natal

Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.

Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.

Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia).
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.

Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia).
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva
na cidade agitada pelo vento.

Natal Natal (diziam). E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.


*Manuel Alegre*
Em “Manuel Alegre – Poesia” (2 Volumes, Obra Poética Completa),
Coimbra, Editora Publicações Dom Quixote, 1ª Edição, 2009.
Meu Epitáfio

Morta... serei árvore
Serei tronco, serei fronde
E minhas raízes
Enlaçadas às pedras de meu berço
são as cordas que brotam de uma lira.

Enfeitei de folhas verdes
A pedra de meu túmulo
num simbolismo
de vida vegetal.

Não morre aquele
que deixou na terra
a melodia de seu cântico
na música de seus versos.


*Cora Coralina*
Em “MEU LIVRO DE CORDEL”, São Paulo, Global Editora, 11ª Edição, 2002.

domingo, 17 de dezembro de 2017

Outra Canção

Desfez-se o sonho para todo o sempre!
Nesta tarde chuvosa
meu coração aprende
a tragédia outonal
que as árvores suportam.

E na doce tristeza
da paisagem que morre
minhas vozes partiram-se.

Desfez-se o sonho para todo o sempre!
Para sempre! Deus meu!,
A neve vai caindo
na campina deserta
de minha vida,
e teme
a ilusão, se vai longe,
que se gele ou se perca.

Como, me disse a água,
que se desfez o sonho para sempre!
É o sonho infinito?
A neblina o sustenta,
e a neblina é tão só
o cansaço da neve.

Meu ritmo vai contando
que se desfez o sonho para sempre.
E na tarde brumosa
meu coração aprende
a tragédia outonal
que as árvores suportam.


*Federico Garcia Lorca*
Em “Obra Poética Completa de Federico Garcia Lorca”, Brasília/DF,
Editora Universidade de Brasília, 5ª Edição, 2004.
Acontecimento

Aqui estou, junto à tempestade,
chorando como uma criança
que viu que não eram verdade
o seu sonho e a sua esperança.

A chuva bate-me no rosto
e em meus cabelos sopra o vento.
Vão-se desfazendo em desgosto
as formas do meu pensamento.

Chorarei toda a noite, enquanto
perpassa o tumulto nos ares,
para não me veres em pranto,
nem saberes, nem perguntares:

‘Que foi feito do teu sorriso,
que era tão claro e tão perfeito?’
E o meu pobre olhar indeciso
não te repetir: ‘Que foi feito...?’


*Cecilia Meireles*
Em “VIAGEM - VAGA MÚSICA”, Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 2ª Edição, 1982.
In extremis

Nunca morrer assim! Nunca morrer num dia
Assim! de um sol assim!
Tu, desgrenhada e fria,
Fria! postos nos meus os teus olhos molhados,
E apertando nos teus os meus dedos gelados...

E um dia assim! de um sol assim! E assim a esfera
Toda azul, no esplendor do fim da primavera!
Asas, tontas de luz, cortando o firmamento!
Ninhos cantando! Em flor a terra toda! O vento
Despencando os rosais, sacudindo o arvoredo...

E, aqui dentro, o silêncio... E este espanto! e este medo!
Nós dois... e, entre nós dois, implacável e forte,
A arredar-me de ti, cada vez mais, a morte...

Eu com o frio a crescer no coração, – tão cheio
De ti, até no horror do derradeiro anseio!
Tu, vendo retorcer-se amarguradamente,
A boca que beijava a tua boca ardente,
A boca que foi tua!

E eu morrendo! e eu morrendo
Vendo-te, e vendo o sol, e vendo céu, e vendo
Tão bela palpitar nos teus olhos, querida,
A delícia da vida! a delícia da vida!


*Olavo Bilac*
Em “Poesias (Alma Inquieta)”, Rio de Janeiro, Editôra Paulo de Azevedo Ltda., 27ª Edição, 1961.
Quando eu disser adeus...

Quando eu disser adeus, amor, não diga
adeus também, mas sim um ‘até breve’;
para que aquele que se afasta leve
uma esperança ao menos na fadiga

da grande, inconsolável despedida...
Quando eu disser adeus, amor, segrede
um ‘até mais’ que ainda ilumine a vida
que no arquejo final vacila e cede.

Quando eu disser adeus, quando eu disser
adeus, mas um adeus já derradeiro,
que a sua voz me possa convencer

de que apenas eu parti primeiro,
que em breve irá, que nunca outra mulher
amou de amor mais puro e verdadeiro.


*Alphonsus de Guimaraens Filho*
 
Em “Poemas reunidos (1935-1960)”, Rio de Janeiro, Editora José Olympio, 1ª Edição, 1960.

domingo, 10 de dezembro de 2017

Dor suprema

Que esta Suprema Dor que minh'Alma envelhece,
Que tanto me acabrunha e tanto desalenta,
Que repele a Ilusão, como o Sonho afugenta,
Que não cede ao Clamor, como não cede à Prece;

Que esta Suprema Dor que me prende e acorrenta
A mágoa de esperar o que nunca aparece,
Que se entranha na Vida e se alarga e que cresce
E de encontro à Alegria, em lágrimas, rebenta;

Seja o meu calmo abrigo, o meu sereno asilo,
Onde minh'Alma vá, toda branca e alquebrada,
Pedir o Pouso e a Paz para um viver tranquilo.

E que exsurja da Treva em que agora ando imerso
Para eterna viver aqui - marmorizada -
Na tristeza imortal da Lágrima e do Verso.


*Mário Pederneiras*
Em “POESIA REUNIDA”, Estudo introdutório, organização e estabelecimento de textos: 
Antonio Carlos Secchin, Coleção Austragésilo de Athayde, 
Rio de Janeiro,  Academia Brasileira de Letras, 2004.
A chuva chove

A chuva chove mansamente... como um sono
Que tranquilize, pacifique, resserene...
A chuva chove mansamente... Que abandono!
A chuva é a música de um poema de Verlaine...

E vem-me o sonho de uma véspera solene,
Em certo paço, já sem data e já sem dono...
Véspera triste como a noite, que envenene
A alma, evocando coisas líricas de outono...

...Num velho paço, muito longe, em terra estranha,
Com muita névoa pelos ombros da montanha...
Paço de imensos corredores espectrais,

Onde murmurem, velhos órgãos, árias mortas,
Enquanto o vento, estrepitando pelas portas,
Revira in-fólios, cancioneiros e missais...


*Cecília Meireles*
Em “NUNCA MAIS... E POEMA DOS POEMAS”, São Paulo, Editora Global, 2ª edição, 2015.
Suavíssima

Os galos cantam, no crepúsculo dormente...
No céu de outono, anda um langor final de pluma
Que se desfaz por entre os dedos, vagamente...

Os galos cantam, no crepúsculo dormente...
Tudo se apaga, e se evapora, e perde, e esfuma...

Fica-se longe, quase morta, como ausente...
Sem ter certeza de ninguém... de coisa alguma...
Tem-se a impressão de estar bem doente, muito doente,

De um mal sem dor, que se não saiba nem resuma...
E os galos cantam, no crepúsculo dormente...

Os galos cantam, no crepúsculo dormente...
A alma das flores, suave e tácita, perfuma
A solitude nebulosa e irreal do ambiente...

Os galos cantam, no crepúsculo dormente...
Tão para lá!... No fim da tarde... além da bruma...

E silenciosos, como alguém que se acostuma
A caminhar sobre penumbras, mansamente,
Meus sonhos surgem, frágeis, leves como espuma...

Põem-se a tecer frases de amor, uma por uma...
E os galos cantam, no crepúsculo dormente...


*Cecília Meireles*
Em “BALADAS PARA EL-REI”, São Paulo, Editora Global, 2ª edição, 2017.
Final

Eu sei de alguém, de um pobre alguém desconhecido,
Que, em certa noite de imortal deslumbramento,
Há de surgir da névoa plácida do olvido,

E há de me ver, depois de tanto sofrimento,
Na paz de quem, nunca tivesse padecido...

Eu sei de alguém, de um pobre alguém que não conhece
A minha vida, a minha sorte, o meu destino,
E que nessa noite, num total desinteresse,

Há de fazer chorar por mim, à alma de um sino,
O largo choro funerário de uma prece...

Eu sei de alguém que, muito longe ou muito perto,
Me há de trazer como presente o longo cofre,
Que todo de oiro e panos roxos vem coberto

E onde se esquece o que se goza e o que se sofre,
Depois da inútil caminhada no Deserto...

Eu sei de alguém, de um pobre alguém pálido e grave,
Que, nessa noite numa semi-sonolência,
Talvez, moroso, maquinal, paciente, cave

O meu caminho para fora da existência...
O meu caminho muito acerbo ou muito suave...

Eu sei de Alguém que tinha n'alma eremitérios
Para o silêncio dos meus êxtases de monge,
Que talvez sofra, de olhos tristes, lábios sérios,

Pensando em mim, pensando em mim, que estou tão longe,
Nas noites brancas em que há luar nos cemitérios...

..........................................................................................................

Oh! todos vós, ó meus irmãos, que, tarde ou cedo,
Piedosamente haveis de vir em meu socorro,
Para que finde este tristíssimo Degredo,

Que a vossa morte seja a Morte de que morro:
Morte sem mal, Morte sem dor, Morte sem medo!...


*Cecília Meireles*
Em “BALADAS PARA EL-REI”, São Paulo, Editora Global, 2ª edição, 2017.
Inicial

Lá na distância, no fugir das perspectivas,
por que vagueiam, como o sonho sobre o sono,
aquelas formas de neblinas fugitivas?

Lá na distância, no fugir das perspectivas,
lá no infinito, lá no extremo... no abandono...

Aquelas sombras, na vagueza da paisagem,
que tem brancuras de crepúsculos do Norte,
dão-me a impressão de vir de outrora... de uma viagem...

Aquelas sombras, na vagueza da paisagem,
dão-me a impressão do que se vê depois da morte...

Lá muito longe, muito longe, muito longe,
anda um fantasma (sic) espiritual de um peregrino...

Lembra um rei-mago, lembra um santo, lembra um monge...

Lá muito longe, muito longe, muito longe
anda o fantasma espiritual do meu destino...

Anda em silêncio: alma do luar... forma do aroma...
Lembrança morta de uma história reticente
que nos contaram noutra vida e noutro idioma...

Anda em silêncio: alma do luar... forma do aroma...
Lá na distância... O meu destino... Vagamente...

..............................................................................

Sentei-me à porta do meu sonho, há muito, nessa
dúvida triste de um infante pequenino,
a quem fizeram, certa vez, uma promessa...

Que é que trazes de tão longe? Vem depressa!
Ó meu destino! Ó meu destino! Ó meu destino!...


*Cecília Meireles*
Em “BALADAS PARA EL-REI”, São Paulo, Editora Global, 2ª edição, 2017.
Na grande noite tristonha

Na grande noite tristonha,
Meu pensamento parado
Tem quietudes de cegonha
Numa beira de telhado.

− Na grande noite tristonha...

Lembram planícies desertas
De uma paisagem do Norte,
As perspectivas abertas
No mundo da minha sorte...

− Lembram planícies desertas...

Ao longe, distancias ermas...
Em tudo quanto se abarca
Há ligeirezas enfermas
De luas da Dinamarca...

− Ao longe, distancias ermas...
Em tudo quanto se abarca
Há ligeirezas enfermas
De luas da Dinamarca...

− Ao longe, distancias ermas...

E sob olhares em pranto
De estrelas alucinadas,
Vais – coroa, cetro e manto,
Ó Rei das minhas baladas!

− E sob olhares em pranto...

.......................................................

Na grande noite tristonha,
Meu pensamento parado
Tem quietudes de cegonha
Numa beira de telhado.

− Na grande noite tristonha...

E eu sonho o meu sonho oculto
De ave triste – que não voa,
Detida a ver o teu vulto
De cetro, manto e coroa...

− Eu sonho o meu sonho oculto...


*Cecília Meireles*
Em “BALADAS PARA EL-REI”, São Paulo, Editora Global, 2ª edição, 2017.
Peregrinação

O córrego é o mesmo,
Mesma, aquela árvore,
A casa, o jardim.

Meus passos a esmo
(Os passos e o espírito)
Vão pelo passado,
Ai tão devastado,
Recolhendo triste
Tudo quanto existe
Ainda ali de mim
 
Mim daqueles tempos!

*Manuel Bandeira*
Em “Lira dos cinquent’anos − Manuel Bandeira”, São Paulo, Global Editora, 1ª Edição, 2013.
Velha chácara

A casa era por aqui...
Onde? Procuro-a e não acho.
Ouço uma voz que esqueci:
É a voz deste mesmo riacho.

Ah quanto tempo passou!
(Foram mais de cinquenta anos.)
Tantos que morte levou!
(E a vida... nos desenganos...)

A usura fez tábua rasa
Da velha chácara triste:
Não existe mais a casa...
−  Mas o menino ainda existe.

*Manuel Bandeira*
Em “Lira dos cinqüent’anos − Manuel Bandeira”, São Paulo, Global Editora, 1ª Edição, 2013.
A recusa das imagens evidentes

I

Rosa que só tens nexo
Fora da tua imagem:
Aqui és só reflexo
Do universo unido
No instante florido
Que ofereces aos que te olham,
Sem te ver, de passagem.

II

Girassol que na retina
Da planície se dissolve.
És a cor mais repentina
Da aragem que te envolve.

Girassol que só te viras
Ao que não te fica perto
E só giras porque giras
Sobre o teu eixo secreto.

Girassol que sem volume
Volume que sem contorno
No despegar-se resume
Só a pressa do retorno.

III

É um outono que não é outono.
Tampouco a estação por que se espera
Na dor de nos deixarern ao abandono
As ninfas que são flores na primavera.

No entanto nas coisas o segredo
De uma só alma põe a sabedoria
Dando à terra repouso no arvoredo
De que o cedro é a sagrada biografia.

IV

Há noites que são feitas dos meus braços
E um silêncio comum às violetas.
E há sete luas que são sete traços
De sete noites que nunca foram feitas.

Há noites que levam-nos à cintura
Como um cinto de grandes borboletas.
E um risco a sangue na nossa carne escura
Duma espada à bainha dum cometa.

Há noites que nos deixam para trás
Enrolados no nosso desencanto
E cisnes brancos que só são iguais
A mais longínqua onda do seu canto.

Há noites que nos levam para onde
O fantasma de nos fica mais perto;
E é sempre a nossa voz que nos responde
E só o nosso nome estava certo.

Há noites que são lírios e são feras
E a nossa exactidão de rosa vil
Reconcilia no frio das esferas
Os astros que se olham de perfil.

V

Há um cipreste que se dissimula
No dia que nos leva pela mão.
E entre brasas de sol que ardem na rua
Uma pomba que faz de coração.

Voa: uma linha recta para a lua
Em sonhos que nos levam de balão.
Perversidade de uma paz futura
Onde só chegaremos de caixão?

E nada nos recorda esse futuro
Escondido atrás das nuvens que trouxeram
Ao nosso rosto os olhos prematuros
Das órbitas reais que nos esperam.


*Natália Correia*

Em “NATÁLIA CORREIA – ANTOLOGIA, O Sol nas Noites e o Luar nos Dias I”
Lisboa, Editora  PROJORNAL, 1ª edição, 1993.
[Volume I, 486 págs.: Inéditos (1941-47); Rio de Nuvens (1947); Inéditos (1947-55); Poemas (1955); 

Inéditos (1955-57); Dimensão encontrada (1957); Inéditos (1957-58); Paqssaporte (1958); 
Inéditos (1958-59); Comunicação (1959); Inéditos (1959-61); Cântico do país emerso (1961); 
Inéditos (1961-66); O vinho e a lira (1966); Inéditos (1966-68); A mosca iluminada (1972).]
Escrito numa ânfora grega

É o teu amor que espalha a tinta
Na minha tela da cor da sede:
Paisagem que a tua paixão pinta
Para eu pendurar numa parede.

Candidatura a bem-amado
Das minhas núpcias de aracnídeo,
Contigo a ver-me de um telhado,
Altura própria para um suicídio.

Mas prometida a um olhar marujo
Na lenda de um Fáon que nunca chega
Quanto mais me amas, mais eu te fujo.
Falta cumprir a sina grega.


*Natália Correia*
Em “NATÁLIA CORREIA – ANTOLOGIA, O Sol nas Noites e o Luar nos Dias I”, 
Lisboa, Editora  PROJORNAL, 1ª edição, 1993. 
[Volume I, 486 págs.: Inéditos (1941-47); Rio de Nuvens (1947); Inéditos (1947-55); Poemas (1955); 
Inéditos (1955-57); Dimensão encontrada (1957); Inéditos (1957-58); Paqssaporte (1958); 
Inéditos (1958-59); Comunicação (1959); Inéditos (1959-61); Cântico do país emerso (1961); 
Inéditos (1961-66); O vinho e a lira (1966); Inéditos (1966-68); A mosca iluminada (1972).]