domingo, 7 de novembro de 2021

 “A MORTE ABSOLUTA
 
Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.
 
Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão – felizes! – num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
 
Morrer sem deixar porventura uma alma errante…
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?
 
Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.
 
Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: ‘Quem foi?…’
 
Morrer mais completamente ainda,
– Sem deixar sequer esse nome.


*Manuel Bandeira*
Em “Lira dos cinquent’anos − Manuel Bandeira”,
São Paulo, Global Editora, 1ª Edição, 2013.

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