sexta-feira, 15 de março de 2013

"Poema da Grande Alegria

Olhavas-me tanto
E estavas tão perto de mim
Que, no meu êxtase,
Nem sabia qual fosse
Cada um de nós...

Era num lugar tão longe
Que nem parecia neste mundo...
Num lugar sem horizontes,
Onde, sobre águas imóveis,
Havia lótus encantados...

Vinham de mais longe...
De ainda mais longe,
Músicas sereníssimas,
Imateriais como silêncios...
Músicas para se ouvirem com a alma, apenas...

E tudo, em torno,
Eram purificações...

Não sei para onde me levavas:
Mas aqueles caminhos pareciam
Os caminhos eternos
Que vão até o último sol...

E eu me sentia tão leve
Como o pensamento de quem dorme...
Eu me sentia com aquela outra Vida
Que vem depois da vida...

Eleito, ó Eleito,
Eu queria ficar sonhando
Para sempre,
Tão perto de Ti
Que, no meu êxtase,
Nem se pudesse saber
Qual fosse cada um de nós...
"

*Cecília Meireles*

Em “Poesias Completas de Cecília Meireles, Viagem, Vaga Música”, Rio de Janeiro, 
Editora Civilização Brasileira - MEC, 1973.

3 comentários:

Brilho disse...

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Personagem

Teu nome é quase indiferente
e nem teu rosto já me inquieta.
A arte de amar é exatamente
a de se ser poeta.

Para pensar em ti, me basta
o próprio amor que por ti sinto:
és a ideia, serena e casta,
nutrida do enigma do instinto.

O lugar da tua presença
é um deserto, entre variedades:
mas nesse deserto é que pensa
o olhar de todas as saudades.

Meus sonhos viajam rumos tristes
e, no seu profundo universo,
tu, sem forma e sem nome, existes,
silêncio, obscuro, disperso.

Todas as máscaras da vida
se debruçam para o meu rosto,
na alta noite desprotegida
em que experimento o meu gosto.

Todas as mãos vindas ao mundo
desfalecem sobre o meu peito,
e escuto o suspiro profundo
de um horizonte insatisfeito.

Oh! que se apague a boca, o riso,
o olhar desses vultos precários,
pelo improvável paraíso
dos encontros imaginários!

Que ninguém e que nada exista,
de quanto a sombra em mim descansa:
— eu procuro o que não se avista,
dentre os fantasmas da esperança!

Teu corpo, e teu rosto, e teu nome,
teu coração, tua existência,
tudo - o espaço evita e consome:
e eu só conheço a tua ausência.

Eu só conheço o que não vejo.
E, nesse abismo do meu sonho,
alheia a todo outro desejo,
me decomponho e recomponho.

Cecília Meireles
in: “Viagem”, 1939



Elaine...

Tua atenção, acolhe!
Grata, sempre.

Fraterno abraço.

Elaine Bastos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Elaine Bastos disse...

BIluminado,

Continuamente tão belo, tão genuíno, tão reflexivo e tão fundo
tudo o que envia para o meu espaço...
Gratíssima!
Fraternurentos abraços.