domingo, 12 de novembro de 2017

In memoriam

I

Seus poemas desenhavam seu fino hastil
suas corolas vibrantes como pequeninas violas
(ou era a vibração incessante dos grilos?)
seus poemas floriam na tapeçaria ondulante dos
prados
onde os colhia a mão das eternamente amadas
(as que morreram jovens são eternamente amadas...)

II

Seus poemas,
dentre as páginas de um seu livro,
apareciam sempre de surpresa,
e era como se a gente descobrisse uma folha seca
um bilhete de outrora
uma dor esquecida
que têm agora o lento e evanescente odor do
tempo...

III

E seus poemas eram, de repente, como uma prece
jamais ouvida
que nossos lábios recitavam - ó temerosa delícia!
como se, numa língua desconhecida,
sem querer, falassem
da brevidade
e da
eternidade da vida...

IV

Ah, aquela a quem seguiam os versos ondulantes
como dóceis panteras
e deixava por todas as coisas o misterioso reflexo
do seu sorriso;
e que na concha de suas mãos, encantada e aflita
recebia
a prata das estrelas perdidas...

V

Nem tudo estará perdido
enquanto nossos lábios não esquecerem teu nome:
Cecília...


*Mario Quintana*
Em “Apontamentos de História Sobrenatural”, Porto Alegre, 
Editora do Globo/Instituto Estadual do Livro, 1ª Edição, 1976.

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