sábado, 4 de novembro de 2017

Ao crepúsculo

Ó tristes lábios meus, rezai, rezai!
É a hora, sim, do Enigma. Eis o momento
Da extrema-unção da luz... E tudo vai
Com ela. E só nos fica o pensamento!

Pela flor que murchou no esquecimento;
Pela asa que se eleva e logo cai;
Pelo sol, pelas nuvens, pelo vento,
Ó tristes lábios meus, rezai, rezai!

Rezai por tudo quanto a morte leva,
Nas horas doloridas, em que a treva
Mostra seu negro vulto que arrepia...

E sinto, em mim, um vago horror profundo,
Uma tristeza já de fim do mundo,
Como se nunca mais houvesse dia...


*Teixeira de Pascoaes*
Em “Cem Poemas Portugueses do Adeus e da Saudade, Selecção, organização 
e introdução de José Fanha e José Jorge Letria”, Lisboa, 
Terramar – Editores, Distribuidores e Livreiros Ltda., 3ª Edição, 2004.

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