quinta-feira, 27 de junho de 2013

Fim

O que eu perdi não foi um sonho bom,
não foi o fruto a embebedar meus lábios,
não foi uma canção de raro som,
nem a graça de alguns momentos sábios.

O que eu perdi, como quem perde uma outra infância,
foi o sentido do enternecimento,
foi a felicidade da ignorância, foi, em verdade,
na minha carne e no meu pensamento,
a última rubra flor do fim da mocidade.

E dói – não esse gesto ausente, a que se apagam
as flores mais solares, mas uma hora,
− flor de momento numa breve aurora −
hora longínqua, esquiva e para sempre morta,
em cuja escura, inacessível porta
noturnos olhos cegamente vagam.


*Abgar Renault*

Em “SONETOS ANTIGOS”, Belo Horizonte, Imprensa da Universidade Federal de Minas Gerais, 1968.

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