domingo, 19 de agosto de 2018

Coisas do reino da minha cidade

Olho e vejo por cima dos telhados patinados pelo tempo
copadas mangueiras de quintais vizinhos.
Altaneiras, enfolhadas, encharcados seus caules,
troncos e raízes de longas chuvas de verão passado.
Paramentadas em verde, celebram a liturgia da próxima florada.
Antecipam a primavera no revestimento de brotação bronzeada,
onde esvoaçam borboletas amarelas.
As mangueiras estão convidando todos os turistas,
para a festa das suas frutas maduras, nos reinos da minha cidade.

Minha mesa está florida e perfumada
de entrada a minha casa, um aroma suave
incensando a casa.
Um bule de asa quebrada, um vidro de boca larga,
um vaso esguio servem ao conjunto floral.
Rosas brancas a lembrar grinalda das meninas
de branco que acompanhavam antigas procissões,
de onde vieram carregando seus perfumes?...
Tão fácil. Por cima do muro da vizinha
a roseira, trepadeira, se debruça
numa oferta floral de boa vizinhança.

Canto e descanto meus vizinhos.
Contei sempre com eles e nunca me faltaram.
beleza simbólica maior: o Dia do Vizinho.

O vizinho é a luz da rua. Quando o vizinho viaja e fecha a casa,
é como se apagasse a luz da rua...
Indagamos sempre: quando volta?
E quando o vizinho volta, abre portas e janelas
e é como se acendessem todas as luzes da rua
e nós todos nos sentimos em segurança
estas coisas nos reinos de Goiá
s.”

*Cora Coralina*
Em “Vintém de Cobre: meias confissões de Aninha”, São Paulo, Editora Global, 10ª Edição, 2013.

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