segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Que ando a esconder de mim

Que ando a esconder de mim
com estes gritos de unhas
contra a injustiça do mundo
que só me deixam no coração
tédios de céu afogado?

Que ando a esconder de mim
com esta raiva do amor pelos outros,
a querer arrancar lágrimas de tudo
para as colar nos olhos vazios?

Que ando a esconder de mim
nesta agonia de escurecer a alma
para a confundir com a noite
– bandeira negra de todos os humilhados?

Que ando a esconder de mim
sem coragem de mostrar aos homens
a minha pobre dor,
tão débil e exígua,
que em vão oculto atrás de toda a dor humana
para a tornar maior?


*José Gomes Ferreira*
Em “Poesia-I”, Lisboa, Editora Portugália, 2ª Edição, 1962.

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