domingo, 8 de julho de 2018

Deixa que o olhar do mundo...

Deixa que o olhar do mundo enfim devasse
Teu grande amor que é teu maior segredo!
Que terias perdido, se, mais cedo,
Todo o afeto que sentes, se mostrasse?

Basta de enganos! Mostra-me sem medo
Aos homens, afrontando-os face a face:
Quero que os homens todos, quando eu passe,
Invejosos, apontem-me com o dedo.

Olha: não posso mais! Ando tão cheio
Desse amor, que minh`alma se consome
De te exaltar aos olhos do universo.

Ouço em tudo teu nome, em tudo o leio:
E, fatigado de calar teu nome,
Quase o revelo no final de um verso.


*Olavo Bilac*
Em “Poesias (Via-Láctea)”, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 29ª Edição, 1977.

2 comentários:

Anônimo disse...

"Nunca se sabe onde está uma despedida.
Até no afã do até logo pode esconder-se um nunca mais.
Na frase infeliz, na simples conversa, algo pode estar morrendo,
do amor ou da amizade. Há despedidas que não são patentes.
Não se lhes percebe o estalo do afastamento, que pode estar no
instante de mau humor, na resposta infeliz, na alegria que não
se repete ou na palavra que deixamos de dar e receber.
Às vezes, está na palavra que dizemos.

Nem sempre as pessoas se separam: esgarçam-se às vezes.
Viver esgarça. É algo que se afasta sem romper completamente.
Também no que esgarça pode haver despedida, pois, embora não
haja perda de matéria, nunca mais será como antes.

Despedir-se é sutil, nem sempre aparece.
Seres em mutação, vivemos a mudar sem saber. Na mudança,
transforma-se em recordação o que antes era união e vontade,
amizade ou convivência.Tudo faz-se retrato, álbum, caderno,
poema, carta, saudade ou memória.
A despedida não é por querer: acontece a despeito.
Um simples "até já" pode conter inimagináveis
nuncas. Ou sempres.

Maravilhosa e cruel à vida! Tudo pode acontecer.
As ligações, salvo poucas, fazem-se precárias e falíveis.
Nosso destino é preso a acontecimentos semicontroláveis.
Ou impulsos, cansaços, e as discordâncias, são imprevisíveis.
E geram despedidas antes insuperáveis.
Ninguém sabe de quem se afastará.
Nem quais as amizades e amores de toda a vida,
nada obstante existam.

Raros captam a dor que estala em cada hipótese de despedida.
Separar-se contém sempre a hipótese da despedida.
Por isso, uma dor sempre se infiltra em cada afastamento.
Algo se assusta, escondido em tudo o que se separa.
Ainda que para ir ali pertinho e logo voltar.

Quem viaja ameaça a despedida.
"Partir é morrer um pouco".
Dizem os franceses, e com razão.
Ainda que para encontrar-se depois,
quem parte arrisca despedidas.
Por isso, a emoção subjacente percorre-lhe
o mistério e a "região das certezas absolutas".

As grandes despedidas
dão-se - contudo - sem que o percebamos.
As que sabemos e sofremos não são despedidas completas,
pois a saudade e a memória hão de trazer de volta o
sentimento genuíno que agora causa dor.
As grandes despedidas infiltram-se no cotidiano
e nos atos corriqueiros de cada dia sem ser percebidas.

Muitos anos depois, vamos verificar
que disfarçado em dia-a-dia ali
estavam e estalavam saudades antecipadas,
vários nuncas dos quais jamais suspeitamos.
Nunca se sabe onde está uma despedida.”

A não ser muito depois!

Artur da Távola

Grande e estimado abraço.
Brilho!

Elaine Bastos disse...

Brilho, nenhum elogio escrito por meras palavras bastaria para descrever os textos de Artur da Távola! Já que por aqui passou, boa(s) leitura(s)! Muitas, por sinal. Apareça sempre! Grata! Um abraço-partilha...