segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Oferenda

Versos... Versos de amor! – Não digas nada!
Seria como o gume de uma espada
a palavra mordaz que eu ouviria.
Não fales! Para que?... Mas, se puderes,
Sorri, como sorris para as mulheres
que tanto te encantaram, certo dia...

Eu sei que é tarde e a primavera é morta,
que tudo é diferente... Mas, que importa
que rosas inda dê, velha roseira?
Que em pleno inverno uma cigarra cante
(por hábito, ousadia... ou por desplante,
ou simplesmente por ser cantadeira?)

São versos que pensei, à tua espera,
embora não passasse de quimera
o sonho que ficou no pó da estrada...
São rimas que busquei para dizê-las,
em noites solitárias, às estrelas...
– Vigília de mulher abandonada...

Recebe-os sem rancor! Eu já não digo
que deves aceitá-los como amigo,
tu que foste o Pierrô do meu passado!
A gente, quando é poeta, (não sabias?)
imagina loucuras, fantasias,
e faz de conta até haver pecado...

E vai rimando assim uns pobres sonhos;
recordações de dias mais risonhos
que o vento para longe foi levando.
Às vezes têm uns laivos de ironia,
o tom cinzento da melancolia
e lágrimas também, de vez em quando...

Escrevo-os para ti. E tu ignoras
que és a inquietude de todas as horas
que a tua incompreensão não adivinha.
Pierrô, há tanto tempo já que te amo
e nada digo e nem sequer reclamo
que compreendas um pouco a angústia minha.

Alegre e descuidada te apareço:
Oh! se soubesses como é alto o preço
do meu silêncio, imposto pela vida!
Mas, em versos sutis ou exaltados,
envio a ti – amado entre os amados,
fragmentos de minha alma comovida...

Recebe-os, pois, sorrindo, e nada digas:
faze de conta que são só cantigas
de uma cigarra pequenina e louca.
E deixa-me sonhar que tu, ao lê-los,
sem saber que são teus, sentirás zelos
dos beijos que sonhei dar-te na boca!


*Adelaide Schloenbach Blumenschein*
Poeta parnasiana brasileira, conhecida por seu pseudônimo “Colombina” 

Em “Inverno em flor”, São Paulo, Editora Cupolo Ltda, 1959.

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